Mutilação genital feminina
Introdução
A mutilação genital feminina (MGF) engloba todos os procedimentos que envolvem a remoção parcial ou total da vulva, sem justificação médica. Representa uma violação dos direitos humanos e uma forma extrema de discriminação contra crianças/mulheres.
É geralmente efetuada a jovens entre os 5 e 12 anos, por elementos sem formação médica e em meios que não garantem condições de higiene adequadas.
Frequência
A prevalência é extremamente variável consoante a região considerada, sendo especialmente frequente em África, e em particular na Somália, Guiné e Djibouti, onde a esmagadora maioria das mulheres é submetida a MGF.
Estima-se que hoje existam mais de 200 milhões de crianças/mulheres alvo desta prática, estando 3 milhões de crianças em risco de sofrer MGF, anualmente.
Tem-se constatado uma diminuição da prevalência global nas últimas três décadas, particularmente em mulheres mais jovens (54% vs 36%, nos segmentos 45-49 anos e 15-19 anos, respectivamente) (1) (3)
Causa
Actualmente a MGF é motivada por crenças sociais de manutenção da castidade feminina, preservação de fertilidade, melhoria da higiene, aumento de status social e do prazer sexual masculino.
Embora seja frequentemente percepcionado como um costume religioso, nenhuma religião aceita/tolera a sua prática.
Sinais e sintomas
A MGF pode ser classificada em quatro tipos:
Fig 1 - Classificação da MGF (Imagem adaptada do National FGM Centre pelo autor.)
Fig. 1
Classif da MGF - National MGF Centre
Sinais/complicações imediatas
- Perda de sangue: anemia, tensão baixa, morte;
- Infecção: infecção da ferida operatória, febre, doença inflamatória pélvica (DIP), tétano, infecção generalizada;
- Lesão na uretra: dificuldade a urinar
- Fracturas: braço, perna. (1)(2)
Sinais/complicações a longo prazo
- Sistema urinário: retenção de urina, infecção urinária de repetição, pedras nos rins
- Cicatrização: fibrose, retenção de sangue no útero e/ou vagina, abcesso vulvar, fusão parcial/total da vulva
- Dor: infecções vaginais de repetição, dor menstrual, perdas de sangue aumentadas. Disfunção sexual, nomeadamente dor nas relações sexuais, diminuição da motivação para manter relações sexuais, incapacidade de atingir orgasmo, especialmente nos casos de MGF radical.
- Infertilidade: dor na relação sexual, que pode culminar em ausência de relações sexuais, estreitamento vaginal, lesão das trompas de Falópio devido a infecção;
- Impacto psicológico: depressão, ansiedade, perturbação do stress pós-traumático, baixa auto-estima e diminuição da confiança na relação filha-mãe;
Impacto negativo na gravidez/parto (vide Evolução/Prognóstico). (1)(2)(3)
O que fazer
As crianças/mulheres afectadas devem procurar ajuda médica, no hospital ou centro de saúde mais próximo.
Em Portugal, caso exista suspeita que uma criança/mulher irá viajar para um país terceiro para ser sujeita à prática da MGF, deve-se comunicar a suspeita aos órgãos de polícia criminal, à Comissão de Proteção de Crianças e Jovens local ou diretamente ao Ministério Público.
Trata-se de um crime público, pelo que o procedimento criminal não depende de queixa da vítima. O progenitor, que tome conhecimento de que a filha irá viajar para um país terceiro para ser sujeita a MGF, poderá comunicar esse facto diretamente ao Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), manifestando expressamente a sua oposição.
Se existir suspeita que a criança/mulher foi submetida a MGF, devem-se contactar as instituições acima referidas, não só para protecção da pessoa afectuada, como para protecção das suas familiares que poderão ser vítimas desde crime[1] .
Tratamento
A defibulação consiste na abertura da cicatriz da MGF que encerra parcial/completamente a entrada da vagina. As principais indicações incluem a promoção da relação sexual penetrativa sem dor, parto vaginal seguro, obstruções vaginais e uretrais sintomáticas, e reconstrução da vulva mutilada.
A altura correcta / ideal para efectuar a defibulação é previamente ao coito ou previamente à gravidez, sendo que pode também ser realizada durante a gestação. (3) (5)
Adicionalmente existem diversos procedimentos correctivos, que permitem minimizar as consequências inerentes aos sintomas urinários, cutâneos, estéticos e sexuais. (5)
Evolução / Prognóstico
Prognóstico durante a gestação
- Monitorização do Trabalho de Parto (TP): O toque vaginal para avaliar o colo do útero é frequentemente realizado para monitorizar a evolução do TP. A existência de MGF pode dificultar ou impossibilitar este procedimento. Adicionalmente, a MGF pode prolongar o TP, sendo portanto sugerida a defibulação no segundo trimestre.
- Resultados obstétricos: Doentes com MGF grau II e III apresentam riscos significativamente superiores de parto por cesariana, hemorragia pós-parto, internamento materno prolongado, necessidade de cuidados neonatais e morte neonatal. Doentes com MGF grau I, II e III apresentaram igualmente aumento significativo do risco de lacerações perineais e de realização de episiotomia. (3) A realização de MGF parece também estar associada a taxa aumentada de partos instrumentados (ventosa/fórceps).
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