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Introdução

A infertilidade caracteriza-se pela incapacidade de obter uma gravidez após 12 meses de relações sexuais regulares e sem uso de contraceção, ou pelo compromisso da capacidade de reprodução como indivíduo ou com o seu parceiro. Considera-se primária quando não existe gravidez prévia, ou secundária se a infertilidade sucede a uma conceção prévia, mesmo que esta   tenha terminado em aborto ou gravidez ectópica. 

A esterilidade define-se como o estado permanente de infertilidade.

Frequência

A frequência da infertilidade é difícil de estimar, com uma variação grande a nível mundial. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), atinge cerca de 17,5% dos casais e, de acordo com a Direção Geral da Saúde (DGS), a frequência será de 10 a 15%. 

Causa

Na maioria dos casais é identificada uma causa, podendo ser de origem feminina, masculina ou mista (10 a 20% dos casos). As principais causas são as alterações da ovulação, os problemas das trompas ou peritoneu (membrana que recobre o interior da cavidade abdominal) e os problemas masculinos. 

Em 10-15% dos casos não se encontra uma causa, considerando-se infertilidade inexplicada ou idiopática.

(Nota: As causas da infertilidade encontram-se descritas de forma mais detalhada no artigo “Avaliação do casal com infertilidade”)

Tratamento

A orientação inicial num casal com infertilidade depende da causa da infertilidade e das suas condições individuais. 

Nesta fase são essenciais o esclarecimento sobre o ciclo menstrual e o aconselhamento sobre a frequência adequada das relações sexuais, que deverá ser a cada um a dois dias na altura da ovulação.

A abordagem inicial deve incluir alterações no estilo de vida, nomeadamente a evicção de substâncias tóxicas como o tabaco, a implementação de uma dieta equilibrada, bem como o incentivo à prática de exercício físico e à perda de peso.

Tratamento de acordo com a causa da infertilidade

Após a avaliação do casal com infertilidade podem ser identificadas causas modificáveis e que podem ser corrigidas.

Nas mulheres com síndrome do ovário poliquístico (SOP), recomenda-se a perda de peso através da dieta e exercício físico. Nesta patologia, a administração de metformina diminui a resistência à insulina e induz a ovulação. O tratamento cirúrgico com o drilling do ovário consiste na realização de pequenos orifícios no ovário para induzir a ovulação e é atualmente considerada uma opção de último recurso no SOP.

Perante a identificação de outra patologia hormonal, tal como hipotiroidismo (diminuição das hormonas da tiróide), hipertiroidismo (aumento das hormonas da tiróide) e hiperprolactinémia (aumento da prolactina), está indicado o seu tratamento e eventualmente referenciação para consulta de endocrinologia. 

Na endometrite crónica (infeção/inflamação da camada interior do útero) está recomendado o tratamento com antibiótico.

Existem intervenções cirúrgicas, para corrigir certas causas de infertilidade ou melhorar as condições para os tratamentos de procriação medicamente assistida (PMA). 

A histeroscopia é uma endoscopia ao útero através da utilização de uma câmara, introduzida por via vaginal, que permite tratar alterações uterinas, nomeadamente pólipos endometriais, miomas submucosos, septos uterinos ou sinequias (aderências).

A cirurgia laparoscópica é realizada através de pequenos orifícios na barriga e poderá estar indicada na endometriose ou perante o diagnóstico de patologia das trompas, com a realização de salpingectomia (remoção da(s) trompa(s)) antes da transferência embrionária.

Perante a identificação de uma causa masculina pode estar recomendada a referenciação para consulta de andrologia (subespecialidade da urologia que estuda a função sexual e infertilidade masculina).

Reprodução medicamente assistida

A reprodução ou procriação medicamente assistida (PMA) inclui várias intervenções e procedimentos para tratar diferentes formas de infertilidade, nomeadamente a indução da ovulação (IO), a estimulação ovárica, o desencadeamento da ovulação, a inseminação intrauterina (IIU) e todas as técnicas de reprodução assistida (TRA).

As TRA são todas as intervenções que incluem o manuseamento no laboratório (in vitro)de óvulos (células reprodutivas da mulher), espermatozóides (células reprodutivas do homem) ou embriões (fase inicial do desenvolvimento de um bebé) para fins de reprodução, ou seja, inclui entre outros a fertilização in vitro (FIV), a injeção intracitoplasmática de espermatozóides (ICSI), a transferência embrionária, o diagnóstico genético pré-implantação e a criopreservação de gâmetas e embriões.

A indução da ovulação (IO) diz respeito à administração de medicação com objetivo de induzir a ovulação, em mulheres que têm ovulações irregulares ou não têm ovulação. Pode realizar-se com medicação oral (citrato de clomifeno ou letrozol) ou injetável (gonadotrofinas) ou com uma combinação destes fármacos.

A medicação oral é administrada, durante cinco dias, com início no 2º ou 3º dia do ciclo menstrual. Estes fármacos são bem tolerados, apenas com efeitos adversos ligeiros, como calores, tensão mamária, dor de cabeça e dor pélvica. O controlo do crescimento dos folículos pode ser avaliado por ecografia, de modo a prever a ovulação.

A utilização de gonadotrofinas está reservada para situações excecionais, pois apesar de ser uma opção muito eficaz, é mais cara, é obrigatório o controlo com ecografia e tem maior risco de gravidez múltipla e de síndrome de hiperestimulação ovárica (SHO). 

A IO pode ser combinada com relações sexuais programadas (de acordo com o desenvolvimento dos folículos) ou com inseminação intrauterina (IIU).

inseminação intrauterina (IIU) é um procedimento, simples e indolor, em que o esperma tratado em laboratório, é introduzido no útero com auxílio de um cateter (Figura 1). É utilizada quando existe infertilidade masculina ligeira, em problemas relacionados com o colo do útero, no contexto de infertilidade inexplicada, para prevenção de transmissão de doenças infeciosas quando apenas um dos elementos do casal está infetado, perante alterações da função sexual ou quando é utilizado esperma doado. 

A fertilização in vitro (FIV) e a injeção intracitoplasmática de espermatozóides (ICSI) são procedimentos que envolvem a fecundação, ou seja, a união dos gâmetas femininos (óvulos) e masculinos (espermatozóides) para dar origem ao ovo ou zigoto. Podem ser realizadas com gâmetas próprios ou doados. Antes destes procedimentos geralmente realiza-se um ciclo de estimulação ovárica, seguido do desencadeamento da ovulação e da punção folicular para obtenção dos óvulos. A estimulação ovárica corresponde à administração de medicação para o que vários folículos se desenvolvam e realiza-se com medicação injetável. O desencadeamento da ovulação é último passo para o amadurecimento dos óvulos. Em situações pontuais pode optar-se por realizar a técnica em ciclo natural, ou seja, sem realizar medicação. A resposta ao tratamento varia de mulher para mulher e é controlada com ecografia e se necessárias análises, com intervalos a definir individualmente. Durante a estimulação pode haver necessidade de cancelar o ciclo, habitualmente por resposta insuficiente dos ovários.

A punção folicular (PF) é o procedimento realizado para aspiração dos óvulos dos ovários, sob controlo com ecografia por via vaginal e habitualmente sob anestesia geral ligeira ou anestesia local (Figura 1). Trata-se de um procedimento cirúrgico minimamente invasivo com complicações raras, nomeadamente hemorragia e/ou infeção. 

No mesmo dia da PF é também efetuada a colheita dos espermatozóides, da ejaculação ou através de punção no testículo. Depois de preparados em laboratório, os óvulos e os espermatozóides são colocados em conjunto para que ocorra a FIV, ou seja, para que se unam e dêem origem ao ovo ou zigoto (FIV). A ICSI difere da FIV no procedimento que se realiza no laboratório, pois um único espermatozóide selecionado em laboratório, pelas suas características é injetado no óvulo.

São candidatos a FIV os casais com infertilidade por alterações nas trompas, com endometriose moderada a severa, com infertilidade masculina moderada, em casos em que os métodos mais simples falharam ou com infertilidade inexplicada. A ICSI reserva-se para situações de infertilidade masculina grave, quando não houve fecundação por FIV ou quando o esperma é obtido por punção no testículo. 

Após a fecundação por FIV e ICSI procede-se a incubação do/os embrião/ões no laboratório, seguida de transferência deste/es para o útero. 

A transferência embrionária (TE) consiste na colocação de embriões no útero com auxílio de um cateter introduzido através da vagina e geralmente sob controlo com ecografia (Figura 1). Este procedimento pode realiza-se no mesmo ciclo - transferência a fresco, ou após a congelação dos embriões - transferência de embrião congelado (TEC). No decurso de um ciclo de FIV/ICSI existe a possibilidade de se obterem vários embriões, podendo os que sobram ser criopreservados ou congelados.

Em Portugal, a criopreservação tem um prazo máximo de três anos, renovável por igual período (total de 6 anos), se solicitado pelo casal. Decorrido este prazo, os embriões podem ser doados a outros casais, utilizados em investigação ou eliminados.

Adicionalmente, em Portugal, podem ser transferidos um ou dois embriões por tentativa e geralmente recomenda-se a transferência de um único embrião para evitar a gravidez gemelar e os riscos associados para a grávida e recém-nascidos, nomeadamente de parto prematuro (antes das 37 semanas de gravidez). 

Cerca de duas semanas após a TE é efetuado um teste de gravidez, que determinará a existência de gravidez ou não. 

A complicação mais grave das técnicas de PMA é a síndrome de hiperestimulação ovárica (SHO).  Esta é uma complicação rara e potencialmente fatal, que ocorre quando há uma resposta excessiva à medicação administrada para a estimulação ovárica. Os profissionais estão alertados para a possibilidade de ocorrência desta situação e quando o risco é elevado o tratamento é adaptado e devem-se congelar todos os embriões para transferência posterior.

(Nota: vide “Síndrome de Hiperestimulação Ovárica”)

O recurso à doação de gâmetas (óvulos ou espermatozóides) torna possível a gravidez em mulheres com insuficiência ovárica prematura (falência dos ovários antes dos 40 anos), com baixa reserva ovárica (poucos óvulos), com óvulos de baixa qualidade e com idade avançada, bem como em homens com infertilidade grave.

Para além das indicações já enunciadas, as técnicas de PMA têm ainda outras indicações, nomeadamente: 

  • A prevenção de transmissão de doenças infeciosas à descendência; 
  • A preservação da fertilidade; Nota: vide “Preservação do potencial reprodutivo”)
  • O diagnóstico genético pré-implantação (DGPI), que corresponde à pesquisa no embrião de anomalias genéticas presentes em algum dos progenitores, de modo a selecionar embriões que não apresentem essas alterações e assim permitir aos casais com doenças graves ter filhos saudáveis; 
  • A concretização de projetos de parentalidade a casais de mulheres e de projetos monoparentais, ou seja, possibilitar a uma mulher sem parceiro ter um filho.

Em Portugal, o Sistema Nacional de Saúde (SNS) tem critérios definidos para o acesso a tratamentos de PMA. Podem aceder aos tratamentos de 1ª linha (IO e IIU) mulheres até aos 42 anos (41 anos e 365 dias ou 366 no caso de ano bissexto) e aos tratamentos de 2ª linha (FIV e ICSI) mulheres até aos 40 anos (39 anos e 365 dias ou 366 no caso de ano bissexto).

À preservação da fertilidade podem aceder utentes até aos 40 anos, podendo o material congelado ser usado até aos 50 anos. Não existe limite de idade para o parceiro masculino. Entende-se como idade limite a idade à data da realização de técnica.

No que diz respeito ao número de ciclos, está definido um limite de 3 ciclos de IIU e FIV/ICSI para cada caso e/ou casal. Relativamente aos antecedentes podem aceder aos tratamentos de PMA, os casais que não têm filhos em comum, independentemente de terem filhos de anteriores relacionamentos; casais com infertilidade secundária, ou seja, com um filho em comum e com critérios atuais de infertilidade; e casais com um filho anterior resultante de PMA e que possuam embriões congelados.

FIG. 1 Tratamentos de procriação medicamente assistida

Evolução / Prognóstico

O sucesso dos tratamentos depende de múltiplos fatores, entre eles a causa da infertilidade, a idade da mulher, o tratamento utilizado e a existência de gravidez prévia. O prognóstico é melhor quando existe uma causa que pode ser corrigida e nas situações de infertilidade secundária. Com o avançar da idade diminui a resposta à estimulação ovárica, a qualidade dos óvulos e dos embriões e aumenta a taxa de aborto. O prognóstico é pior quando existe infertilidade inexplicada, problemas no útero ou múltiplas causas a contribuir para a infertilidade.  

Após a correção de um distúrbio hormonal, a ovulação regular consegue ser restabelecida em 90% dos casos. 

Nos distúrbios da ovulação, a IO com medicação oral consegue induzir a ovulação em 80% dos casos, com gravidez em menos de 50% dos casos e uma taxa de gravidez gemelar de cerca de 5%. Com a utilização de medicação injetável (gonadotrofinas), a taxa de ovulação é de 80 a 90% e a taxa de gravidez de 20 a 60%. Contudo, o risco de hiperestimulação ovárica é de 1 a 2% e o risco de gravidez gemelar de cerca de 15%.

A taxa de sucesso da IIU varia entre 10 e 20% e a taxa de sucesso média da FIV/ICSI é de cerca de 40%, podendo variar de acordo com o local onde se realize o tratamento, pelo que cada centro deve dar essa informação aos seus casais.

Nos casos de infertilidade inexplicada, a taxa de sucesso com tratamento é semelhante à taxa gravidez espontânea (sem tratamentos), sendo cerca de 60% após 3 a 5 anos.

Prevenção / Recomendações

  • Evitar o adiamento do projeto de parentalidade;
  • Optar por um estilo de vida saudável; 
  • Manter o controlo de doenças crónicas;
  • Realizar uma consulta pré-concecional (consulta realizada quando se planeia uma gravidez, ainda antes de estar grávida);
  • Conhecer a frequência adequada das relações sexuais;
  • Ir a uma consulta de infertilidade ao fim 12 meses a tentar engravidar ou 6 meses se idade da mulher superior a 35 anos ou existirem outros fatores de risco para infertilidade.

Saber Mais

“Endometriose e Infertilidade”

"Septo Uterino e Infertilidade”

“Miomas uterinos e Infertilidade”

“Síndrome do Ovário Poliquístico e Infertilidade”

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