Falha recorrente de implantação
Introdução
A definição de falha recorrente de implantação, comumente designada por “RIF” (“recurrent implantation failure”) é controversa. Uma das definições mais amplamente aceites define RIF como a incapacidade de alcançar uma gravidez clínica após a transferência de pelo menos quatro embriões de boa qualidade num mínimo de três ciclos frescos ou congelados numa mulher com idade inferior a 40 anos (1).
A Sociedade Europeia de Reprodução Humana e Embriologia (ESHRE, European Society of Human Reproduction and Embryology), em 2023, propõe que o termo RIF se aplique no cenário em que a transferência de embriões considerados viáveis não resultou num teste de gravidez positivo com frequência suficiente num doente específico para justificar a consideração de novas investigações e/ou intervenções (2).
Epidemiologia
O RIF afeta entre 8 a 10% dos casais submetidos a técnicas de procriação medicamente assistida, com transferência embrionária (3).
Sinais e sintomas
Na avaliação inicial de um casal deve ser realiza uma revisão detalhada da história clínica e exame objetivo completo. Perante o diagnóstico de falha recorrente de implantação, poderá ser necessário atualizar a história médica do casal, no caso de surgirem novas informações ou queixas de novo.
Anamnese
Na avaliação inicial de um casal deve ser realiza uma revisão detalhada da história clínica e exame objetivo completo. Perante o diagnóstico de falha recorrente de implantação, poderá ser necessário atualizar a história médica do casal, no caso de surgirem novas informações ou queixas de novo.
Exame objectivo
No que respeita ao exame objetivo, deverá ser repetido o exame ginecológico.
Causas
A RIF tem diversas e variadas causas. Encontrar a causa é o foco e o grande desafio do diagnóstico e tratamento. A origem é complexa e pode incluir fatores femininos, masculinos e embrionários. É de salientar que na origem da RIF pode não estar apenas uma causa única, mas em vários fatores.
Apresenta-se uma lista das origens mais comuns de RIF(4):
Fatores femininos
- Fatores imunológicos
- Trombofilias
- Distúrbios na recetividade endometrial
- Microbioma e endometrite crónica
- Anomalias anatómicas
- Miomas
- Pólipos endometriais
- Sinéquias (cicatrizes da cavidade uterina)
- Malformações do aparelho reprodutor
- Endometriose/Adenomiose
- Hidrossalpinge (Trompa dilatada)
Fatores masculinos: não há evidência científica suficiente para afirmar que existe associação direta entre fatores masculinos e RIF.
Fatores embrionários: As anomalias genéticas nos embriões são mais comuns em casais com RIF do que no resto da população.
Para além disto, outros fatores de risco podem aumentar a probabilidade de RIF tais como: excesso de peso e obesidade, tabagismo, consumo de álcool e stress.
O que fazer
Os exames complementares recomendados para auxiliar o estudo de mulheres com RIF têm de ser selecionados individualmente pelo médico com base nas possíveis origens.
Patologia Clínica
Fatores imunológicos: Os testes mais frequentemente utilizados são a pesquisa de alguns anticorpos, no entanto, a sua pesquisa não está recomendada por rotina (2).
Função tiroideia: A avaliação da função da tiróide não está recomendada por rotina (2).
Trombofilias: Nas mulheres com história pessoal ou familiar de eventos tromboembólicos, é recomendado efetuar a pesquisa das trombofilias. Nas mulheres sem fatores de risco o estudo deverá ser efetuado sempre que exista suspeição clínica e deverá ser considerado nos outros casos (2).
Anomalias cromossómicas: As anomalias genéticas nos cromossomas do casal são consideradas como um potencial fator de risco para RIF e, apesar de ser uma situação pouco frequente, deve ser oferecido o estudo dos cromossomas ao casal (2).
Avaliação da recetividade endometrial: Pode ser ponderada a medição da progesterona em várias fases do ciclo menstrual, caso se suspeite que esta poderá estar elevada numa fase mais precoce que o habitual ou que esteja a ser produzida em níveis mais baixos que o habitual. Através da ecografia ginecológica é avaliada a espessura do endométrio. Se o endométrio não atingir uma espessura adequada recomenda-se nova ecografia. No caso de o endométrio permanecer fino poderá ser necessário alterar a medicação da doente. Nestes casos, poderá ainda ser pertinente a realização de uma histeroscopia.
Recentemente, têm surgido testes de recetividade endometrial (ex. teste ERA), cujo objetivo é avaliar o estado do endométrio de cada doente e identificar o melhor momento para realizar a transferência do embrião para o útero. Apesar de vários estudos estarem a ser desenvolvidos, não existe, de momento, evidência que permita recomendar a realização de algum destes testes.
Anomalias anatómicas: A ecografia ginecológica é o exame imagiológico inicial mais adequado para avaliação ou exclusão de alterações anatómicas na mulher com RIF (2). Se persistir alguma dúvida após a ecografia transvaginal, poderá ser considerada a realização de outros exames como histerossonografia (ecografia transvaginal com injeção de soro na cavidade uterina) / histerossalpingografia (radiografia ao útero e trompas com injeção de contraste na cavidade uterina) ou ecografia 3D. Na suspeita de alterações no endométrio está recomendada a realização de uma histeroscopia.
Microbioma e endometrite crónica: A investigação da presença de uma infeção crónica do endométrio também deverá ser ponderada. Perante a suspeita, está recomendada a realização de uma histeroscopia (endoscopia ao útero) com colheita de um fragmento de endométrio (biópsia) que será depois analisado para confirmar ou excluir infeção.
O microbioma endometrial refere-se aos microorganismos habituais, que não causam doenças, presentes na cavidade uterina de cada mulher. O estudo do microbioma não é recomendado.
Espermograma com teste de fragmentação de DNA: É um teste que avalia a integridade do material genético numa amostra de esperma, mas a sua realização não é recomendada por rotina.
Tratamento
As recomendações para tratamento de mulheres com RIF variam consoante a origem do problema. O plano de tratamento terá de ser elaborado individualmente.
Médico
Otimização dos fatores de risco: As mulheres deverão ser aconselhadas a deixar de fumar (2), assim como implementar medidas para diminuir o stress (4,5). No caso de mulheres com excesso de peso e obesidade, devem-lhes ser oferecidas aconselhamento nutricional para ajudar na perda de peso.
Fatores imunológicos: Têm surgido alguns estudos sobre medicamentos que tem como objetivo aumentar o sucesso da implantação em doentes com RIF. Apesar de alguns apresentarem resultados promissores, estas terapêuticas não estão recomendadas.
Trombofilias: Nas mulheres com RIF e perante a detecção de uma trombofilia poderá ser aconselhada pelo médico a introdução de medicação anticoagulante com associação de um antiagregante (como a aspirina).
Distúrbios na recetividade endometrial: No caso de existir um endométrio fino poderá ser necessário rever a medicação que a doente toma. Poderá ser preciso suspender a transferência de embriões caso se confirme um aumento precoce do nível de progesterona.
Protocolo: Existem vários tipos de protocolos de estimulação que são utilizados em mulheres com RIF. Atualmente, não há provas que algum protocolo específico deva ser utilizado preferencialmente nestes casos. A abordagem deve ser individualizada.
- Outros: Preferencialmente, as transferências de embriões deverão ser guiadas por ecografia, pois os estudos revelam taxas mais altas de gravidez.
Antibioterapia
Microbioma e endometrite crónica: No caso de ser diagnosticada uma infeção, nomeadamente endometrite crónica, esta deve ser tratada com antibióticos (3).
Como referido anteriormente, o estudo do microbioma endometrial não está recomendado. Do mesmo modo, não está indicado nenhum tipo de tratamento para o tentar alterar como, por exemplo, o uso de probióticos.
Cirúrgico
Anomalias anatómicas: Algumas alterações da cavidade uterina devem ser tratadas com recurso a cirurgia por histeroscopia nomeadamente, pólipos, miomas dentro da cavidade, septos uterinos ou sinéquias. No caso da existência de hidrossalpinge (acumulação de líquido da trompa), poderá ser aconselhada a remoção cirúrgica da trompa.
(Nota: Poderão ser consultas dos seguintes artigos “Miomas e infertilidade” e “Septo uterino e infertilidade”)
Outro
Fatores embrionários: No caso de ser detectada uma anomalia nos cromossomas no casal, recomenda-se um aconselhamento genético e, quando adequado, poderão ser considerados a realização de testes genéticos pré-implantatórios (testes realizados no embrião antes da transferência para perceber se tem alguma alteração genética dos cromossomas).
Evolução / Prognóstico
O prognóstico de cada doente vai depender da causa individual do RIF. Muitas das causas de RIF são possíveis de tratar, especialmente as alterações anatómicas, mas também as causas trombóticas ou infeciosas.
Conjuntamente, é possível um diagnóstico atempado de causas de origem genética através de testes genéticos pré-implantatórios e posterior seleção embrionária (escolher implantar embriões que não tenham alterações genéticas), permitindo um bom prognóstico.
No entanto, é essencial a realização de mais estudos nesta área, especialmente ao nível da investigação dos fatores imunológicos, genéticos, anatómicos, hematológicos, microbianos e endócrinos que poderão estar alterados e serem suscetíveis de tratamento.
Prevenção / Recomendações
O acompanhamento psicológico é considerado uma parte essencial do tratamento de fertilidade (2) e deve ser oferecido antes, durante, e após os tratamentos de procriação medicamente assistida. Este seguimento deve ser reforçado no apoio aos casais com RIF.
Saber Mais
Falha recorrente de implantação (RIF) - Incapacidade de alcançar uma gravidez clínica após a transferência de pelo menos quatro embriões de boa qualidade num mínimo de três ciclos frescos ou congelados numa mulher com idade inferior a 40 anos. / Cenário em que a transferência de embriões considerados viáveis não resultou num teste de gravidez positivo com frequência suficiente num doente específico para justificar a consideração de novas investigações e/ou intervenções.
Procriação medicamente assistida (PMA) - Quaisquer tratamentos relacionados com fertilidade nos quais os gâmetas ou embriões são manipulados.
Transferência embrionária – Etapa do processo de procriação medicamente assistida na qual o/os embrião/ões são transferidos para a cavidade uterina com a intenção de estabelecer uma gravidez.
Deseja sugerir alguma alteração para este tema?
Existe algum tema que queira ver na Ginepedia - Enciclopédia Online?